Observo meu pai e muito bem, diga-se de passagem. Depois das 18h, encerrou o horário de expediente. A vida é outra. A cabeça sobrevoa sobre outros arredores. Os cálculos ficam para depois e os clientes não têm o número daqui de casa.
Mas ser bailarino? Hum...eita, profissão complicada. Levanta a mão aí quem nunca juntou algo do chão num panchè, caiu e saiu rolando, ouviu uma música e já começou a mexer, involuntariamente, alguma parte do corpo.
Concordo que muitos deixam de lado a lubrificação das articulações e alongamento dos músculos, esquecem da consciência e da persistência, até mesmo quando se tratam dos famosos abdominais, por exemplo. Mas parar o corpo por inteiro e não se deixar levar pela melodia até mesmo do silêncio...ah, isso eu duvido!
Duvido porque conheço a raça. Bailarino é tudo igual. Mentira. Mentira das grandes. Me empolguei no ditado barato. Desculpa. Mas bailarino “tudo dança”. Pronto, melhorou. Essa, apesar de óbvia, faz pensar.
Não é preciso sala, música, professor gritando, contagem, muito menos hora marcada. A dança, quando inerente ao corpo, não se cala. Corpo que realmente dança vive cantando com a voz dos movimentos, mesmo distante da rotina de aulas, ensaios, espetáculos. Afinal, o corpo também canta sobre descanso, praia, família ou seja lá como são suas férias.
Confesso: minha cervical está tensa, dura é meu apelido e saudade é a primeira palavra que sai da minha boca ao lembrar dos corredores do Bolshoi, das salas, do linóleo, da família dançante.
Sabe aquela história de dar valor quando perde? Não tem nada a ver. Só falei pra enfeitar o texto. Porque a grande verdade é que damos valor, sim. E caso não seja assim, ainda há tempo.
Não tem preço espreguiçar todo dia rodeada de colegas “quase” profissionais, sentir o corpo, ouvi-lo e deixá-lo falar. Não tem preço o frio na barriga da coxia. Os ensaios tensos e as contagens que nunca dão certo. Não tem preço a prova do figurino, as viagens, o plié nosso de cada dia.
A dança é minha oração, minha forma de gritar ao mundo o que as palavras não dizem. Com ela, canto canções até mesmo sem melodia, prego o que acredito, choro o que nem as lágrimas conseguem chorar. Talvez seja a forma mais clara de me traduzir.
Não há rotina diferente, nem férias que nos separem. Se não nasci para falar essa língua, pelo menos hoje tenho a certeza de que é com este o idioma que ESCOLHI me comunicar.
Muiiiiittttttttoooooooooooooo boooooommmmmm!!!!!
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